Page 42 - Sinal Plural 18
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CU LTU R A / HISTÓ RI A

    No Caminho,

    Assim como a criança            com Maiakóvski
    humildemente afaga
    a imagem do herói,              com os senhores do mundo,       Mas ao tempo da colheita
    assim me aproximo de ti,        por temor nos calamos.          lá estão
    Maiakóvski.                     No silêncio de meu quarto       e acabam por nos roubar
    Não importa o que me possa      a ousadia me afogueia as faces  até o último grão de trigo.
    acontecer                       e eu fantasio um levante;       Dizem-nos que de nós emana
    por andar ombro a ombro         mas manhã,                      o poder
    com um poeta soviético.         diante do juiz,                 mas sempre o temos contra
    Lendo teus versos,              talvez meus lábios              nós.
    aprendi a ter coragem.          calem a verdade                 Dizem-nos que é preciso
    Tu sabes,                       como um foco de germes          defender nossos lares
    conheces melhor do que eu       capaz de me destruir.           mas se nos rebelamos contra a
    a velha história.               Olho ao redor                   opressão
    Na primeira noite eles se       e o que vejo                    é sobre nós que marcham os
    aproximam                       e acabo por repetir             soldados.
    e roubam uma flor               são mentiras.                   E por temor eu me calo,
    do nosso jardim.                Mal sabe a criança dizer mãe    por temor aceito a condição
    E não dizemos nada.             e a propaganda lhe destrói a    de falso democrata
    Na segunda noite, já não se     consciência.                    e rotulo meus gestos
    escondem:                       A mim, quase me arrastam        com a palavra liberdade,
    pisam as flores,                pela gola do paletó             procurando, num sorriso,
    matam nosso cão,                à porta do templo               esconder minha dor
    e não dizemos nada.             e me pedem que aguarde          diante de meus superiores.
    Até que um dia,                 até que a Democracia            Mas dentro de mim,
    o mais frágil deles             se digne aparecer no balcão.    com a potência de um milhão
    entra sozinho em nossa casa,    Mas eu sei,                     de vozes,
    rouba-nos a luz, e,             porque não estou amedrontado    o coração grita - MENTIRA!
    conhecendo nosso medo,          a ponto de cegar, que ela tem
    arranca-nos a voz da garganta.  uma espada                      O famoso trecho, gravado pelo ator
    E já não podemos dizer nada.    a lhe espetar as costelas       Juca de Oliveira, pode ser ouvido em
    Nos dias que correm             e o riso que nos mostra         ht t p://w w w.cu lt u rabrasi l.org/ca mi-
    a ninguém é dado                é uma tênue cortina             nhocomaiakovski.htm
    repousar a cabeça               lançada sobre os arsenais.
    alheia ao terror.               Vamos ao campo
    Os humildes baixam a cerviz;    e não os vemos ao nosso lado,
    e nós, que não temos pacto      no plantio.
    algum

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