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em baixa, sem condições de investir,        seja, controlar o gasto público como pré-  de investir porque não consegue vender
caberia ao Estado o papel de induzir o      -requisito para um programa de investi-    o que está produzindo.
crescimento ou pelo menos promover          mento consistente.
ações para mitigar os efeitos da crise.                                                     Se investir é essencial para fazer gi-
Isso não é possível por conta das amar-          Segundo João Sicsú, essa discussão    rar a roda da economia, como articular
rações da Emenda Constitucional.            tem quase cem anos. E nas mesmas con-      a retomada de investimentos sem com-
                                            dições. Nos anos 1930, com a economia      prometer o controle do gasto público?
     Até o Banco Mundial, que apoiou        do mundo em depressão, o debate fazia      Haveria um grau de déficit aceitável e
o congelamento dos gastos desde o iní-      sentido, a seu ver, porque não havia ex-   também um nível de investimento ne-
cio, divulgou um documento em agosto        periência acumulada sobre como tirar       cessário para retomar o desenvolvimen-
onde propõe deixar os investimentos pú-     uma economia do atoleiro. Os gover-        to? “Só há consenso de que não se deve
blicos fora do alcance da regra. É verdade  nantes olhavam os indicadores econô-       aumentar este déficit de forma abrupta,
que, em troca, o Bird sugere um ajuste      micos, sobretudo a vertiginosa queda da    porque isso pode demonstrar alguma
mais duro em gastos obrigatórios como       arrecadação, e sentenciavam: é preciso     incapacidade do governo de honrar suas
benefícios previdenciários e salários de    cortar gastos.                             dívidas. Mas nós estamos longe disso,
servidores. Seja como for, a posição do                                                porque não tem ninguém no Brasil, hoje
Banco Mundial reforça a percepção de             Hoje, de acordo com o professor da    em dia, que ache que o governo vai dar
que a Emenda 95 contribuiu para pio-        UFRJ, a reflexão segue outro caminho.      algum tipo de calote”, argumenta Sicsú.
rar as incertezas econômicas, ao con-       Partindo-se da premissa de que sempre
trário do que se dizia na época em que      há déficit público numa economia re-       RECURSOS PARA INVESTIR
foi aprovada.                               cessiva, a questão, para Sicsú, é saber
                                            qual a decisão correta para equilibrar o   Em relação ao nível de investimen-
     Na campanha eleitoral, Bolsonaro       orçamento. É preciso fazer a economia      to necessário, as opiniões se dividem.
defendeu a manutenção do Teto de            crescer ou cortar gastos pra adequá-los    Para o presidente do Banco Nacional de
Gastos. Paulo Guedes, o futuro supermi-     ao tamanho da receita?                     Desenvolvimento Econômico e Social
nistro da Economia, já sinalizou sua pre-                                              (BNDES), Dyogo Oliveira, há espaço para
ferência pela privatização de empresas           “Cortando gastos, o governo em-       crescer sem a necessidade de investimen-
públicas como forma de fazer caixa, sem     purra a economia pra baixo. Então au-      tos mais fortes, porque a utilização da
alterar uma vírgula da Emenda do Teto.      menta a dificuldade para equilibrar o      capacidade instalada da indústria está
                                            orçamento. Cortando gastos, vai haver      baixa. De fato, a indústria brasileira ope-
RECEITAS VELHAS                             arrecadação que possibilite investimen-    ra atualmente 14,1% abaixo do pico de
                                            to? Não vai”, afirma. Por outro lado,      produção registrado em maio de 2011.
Confirmada a eleição de Bolsonaro,          acrescenta, “não adianta aumentar a
Paulo Guedes reafirmou o compromis-         arrecadação se for mantido este limite          Sicsú, por sua vez, entende que não
so do presidente eleito com o controle      para aumentar os gastos”.                  há nenhum argumento ou dados estatís-
do gasto público. Além de priorizar a                                                  ticos que impeçam o investimento em
reforma da Previdência, o economista             Autor do vigoroso estudo “Brasil:     época de recessão. Calibrar este investi-
disse que o novo governo vai acelerar as    é uma depressão, não foi apenas uma        mento é o “x” da questão. Ainda que as
privatizações e promover uma “reforma       recessão”, Sicsú entende que a insufi-     previsões otimistas do FMI se confirmem
do Estado”, concentrando os esforços        ciência de demanda reduziu a ocupa-        — o órgão estima um crescimento eco-
na redução dos gastos com a máquina         ção da capacidade instalada existente      nômico de 2,4% para 2019, impulsiona-
pública e na redução de privilégios e des-  e, mais ainda, diminuiu a realização de    do pelo consumo privado —, o professor
perdícios. Em relação aos investimen-       investimentos. Além disso, o professor     da UFRJ não vê condições objetivas para
tos, Guedes disse apenas que pretende       da UFRJ faz uma curiosa relação entre o    que o Brasil possa fechar a década tendo
definir corretamente os marcos regu-        investimento público e o privado: “Toda    recuperado o PIB de 2014. Para que o con-
latórios para investimentos na área de      vez que cai o investimento público, cai    sumo aumente, avalia Sicsú, será neces-
infraestrutura.                             o investimento privado também”. Ele        sário que a taxa de desemprego se reduza
                                            explica que isso acontece porque toda a    velozmente já que aumentos reais nos
     O discurso de Paulo Guedes segue       economia se retrai quando o setor públi-   rendimentos dos trabalhadores não es-
a mesma linha adotada por Henrique          co corta gastos. Com menos consumo, a      tão ocorrendo, de acordo com a Pesquisa
Meirelles durante o governo Temer, ou       demanda encolhe e o empresário deixa

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