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vocês não têm um banco de desenvolvimento?                    é isso que está acontecendo. Acho que no início, sim,
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■ Sim. Temos o Banco de Desenvolvimento Econômico e           o sistema virou meramente comercial, com o Consenso
Social – que é um banco público. Há muita pressão para        de Washington e a onda ideológica de Collor e Menem.
que o BNDES, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica            Acredito que, a partir de 2000, houve uma tentativa de
Federal sejam os propulsores do câmbio. Com interesse         retorno. Pelo menos, as intenções, especialmente de
menor, esses bancos públicos podem fazer com que os           Duhalde, que não é santo da minha devoção, mas... en-
bancos privados, para serem competitivos, baixem suas         fim! Ele buscou redirecionar o Mercosul, e até Lula tentou
taxas. Claro. Essa deveria ser a função das instituições      dobrar um pouquinho mais a aposta com o Unasul - União
públicas. Um banco que não seja o Banco Central, o Ban-       de Nações Sul-Americanas (integra os dois blocos de livre
co de la Nación, por exemplo. Como não precisa ter um         comércio sul-americanos, Mercosul e Comunidade Andina
rendimento exorbitante, porque não reparte dividendos,        de nações, além do Chile, Guiana e Suriname, nos moldes
pode e deve ser o que tem mais transparência. Ou seja,        da União Européia). Mas o que ocorreu durante os anos
que o controle externo, tanto do sistema político, como do    1990 é que o Mercosul ficou como um acordo comercial,
cidadão, da sociedade civil, tem de ser muito alto e deveria  não foi possível avançar no institucional nem no político
poder emprestar a taxas baixas. O Banco de la Nación está     além do formal.
fazendo isso, só que o governo está utilizando cerca de 30%
dos depósitos que estão na instituição. O governo nacional    ■ Quais são os grandes desafios para que esse tratado seja
já os tem utilizado para se financiar, e esse é dinheiro que  realmente um projeto de integração? Se olharmos desde os
está sendo subtraído do sistema produtivo privado. Nós        anos 1980, quando ambos países retornaram à democracia,
tivemos um Banco de Desenvolvimento, o Banade, que,           veremos uma evolução muito positiva no intercâmbio comer-
lamentavelmente, era uma espécie de caixa para os ami-        cial. Nosso sócio principal hoje é o Brasil. E isso não era assim.
gos, que nos levou à dívida externa dos anos 1970 e 1980,     Também, a desconfiança militar mútua já não existe, não há
com projetos de desenvolvimento monumentais que nunca         exércitos se olhado com desconfiança. Um dado importante
vimos e que enriqueceram muita gente.                         nesta década é que o Brasil começa a emergir como um líder
                                                              da região. E isto, evidentemente, toca um pouco o nosso ego.
■ Nos últimos anos, o Mercosul perdeu força, fundamen-        O dos argentinos sempre foi grande. Mas ainda temos muitas
talmente em função das disputas entre seus dois maiores       coisas das quais podemos nos orgulhar. Hoje temos mais no-
integrantes: Brasil e Argentina. Pelo lado do Brasil, hoje a  ção dos tamanhos relativos de nossas economias e de diversas
integração latino-americana é um dos principais pilares,      coisas que fazem que seja o Brasil que seguramente lidere,
digamos, da política externa do governo Lula. Há todo         em grande parte, esta região. Mas para que essa liderança
um empenho do Brasil em relação à Argentina e a outros        seja estável, ele precisa de uma Argentina também estável, e
países da América Latina. Como a senhora vê a posição da      acho que temos muita complementaridade.
Argentina em relação ao Brasil? Vejamos, primeiro, qual é     Vimos – e isso é uma boa constatação – que, antes, dar um
o ponto de vista brasileiro?                                  salto importante em matéria de desenvolvimento levava
                                                              décadas. Por exemplo: o desenvolvimento e o bem-estar
■ A ideia era que o Mercosul evoluísse de uma área            social que a Argentina tinha conseguido no século XX pare-
de comércio para um mercado comum, assim como na              cia difícil para a maioria dos países. E vemos o Brasil, que
Comunidade Europeia. Hoje, a Europa é um mercado              teve dois períodos presidenciais, dois governos, 16 anos
comum de bens e de trabalho. Que houvesse também              de estabilidade, de continuidade, que obteve mudanças
uma integração institucional e política. Parece que não       admiráveis. Começamos a ver um Brasil sobre o qual nin-

                                                              abril 2010  31
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