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guém falava na década de 1990. Vemos Uruguai, o pequeno     uma política agropecuária melhor, porque agora vemos o
Uruguai, um país que expulsava pessoas, nostálgico, e que   Brasil produzir mais carne e grãos do que nós. Temos uma
com somente cinco anos de Tabaré teve uma visão mais        política de enfrentamento com o campo, mas, se rever-
moderna. Começamos a olhar para o Chile, que era um país    termos isso, há um enorme potencial também em outras
mais pobre, com poucos recursos e muitas dificuldades. E    áreas, tais como a energética e a científica. Temos também
já são 20 anos! Então, a gente vê que o desenvolvimento     um país com uma cultura muito empreendedora. Então, na
não é uma empreitada impossível. Começar a ser confiável    realidade, é mais a agitação social e política que está nos
e sustentável para os próprios cidadãos e para a economia   fazendo ficar para trás. Vemos o caso do Chile. Teria gostado
global, que é uma ameaça, mas onde também existe muito      mais que ganhasse o candidato da Concertação (Eduardo
dinheiro disponível. Os países que começam a pôr em or-     Frei, segundo presidente eleito após a saída de Pinochet
dem sua economia recebem muito investimento direto. E       do poder), mas vemos que o Chile vai transitar dentro de
isso ajuda. Não é possível crescer somente com a poupança   certos trilhos. Se a Argentina consegue isso, com um Brasil
própria, como era a fórmula de outras décadas.              já mais estável, podemos ser sócios muito benéficos um
                                                            para o outro. É isso que nós vemos.
■ E na Argentina, como a senhora vê o seu futuro? A
Argentina é um país cheio de possibilidades, porque tem     ■ Um projeto que temos no Banco Central é o desen-
uma base muito saudável. Tem recursos variados, tem uma     volvimento de uma moeda comum, e o primeiro passo
população basicamente educada, mas falta um pouco mais      para isso são as exportações e importações entre Brasil
de estabilidade. Hoje temos mais um problema político do    e Argentina com moeda local. Bom, isso já está acon-
que econômico e, se isso for bem equacionado, e conse-      tecendo e é um grande avanço. E voltando à autonomia
guirmos ter um Henrique Cardoso ou um Lula, vamos para      do Banco Central, numa situação como essa, fica claro
frente. Porque acho que um governo sucedeu o outro e        que os bancos centrais devem ter um grau de autonomia,
melhorou aquilo que o outro deixou. Essa é a minha visão.   porque se o governo de turno começa a manipular o tipo
Se a Argentina fizer o mesmo, e já deixamos para trás a     de câmbio com políticas populistas ou demagógicas ou
cultura do receio e da desconfiança, podemos ser sócios,    cede às pressões dos bancos privados e distorce isso, a
e daríamos à América do Sul um norte muito interessante.    complementaridade entre os países fica impossível. Porque
Interessantíssimo. Nós achamos que estamos agora num        as políticas devem ser de longo prazo, e não depender de
momento de turbulência política e não sabemos como vamos    necessidades conjunturais. Chega a campanha eleitoral e
ultrapassar este período.                                   quero mudar o tipo de câmbio para me beneficiar, porque
                                                            assim a estratégia de médio ou longo prazo não funciona.
■ Quando são as eleições presidenciais? Serão em 2011.      Essa é também uma das grandes questões, por isso, por
Teoricamente, em outubro, mas pode ser que sejam antes;     exemplo, os bancos centrais da Europa não podem ser tão
se o governo se vir em uma situação complicada, pode        autônomos, porque existe o Banco Central Europeu, da
adiantá-las. Essa transição é ainda um momento muito        União Europeia, que é responsável pela harmonização de
difícil, mas na verdade nós olhamos a Argentina com con-    todas essas políticas monetárias.
fiança. No contexto internacional, não parece que possa
acontecer alguma coisa imprevisível, ainda que isso sempre  ■ Mais de uma vez nesta entrevista, a senhora disse que
possa acontecer, e em termos de intercâmbio comercial o     os interesses eleitorais contaminam a vida política do
mundo quer as coisas que a Argentina produz. Não significa  país. Do ponto de vista do aprofundamento da demo-
que vamos ser sempre um país agrícola – somente agrícola    cracia, que tipo de reforma política seu partido propõe?
–, porque temos outras potencialidades. Mas podemos ter     Na Argentina, seria fundamental ter somente um período

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