Page 14 - Por Sinal 48
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ARTIGO
Banco Central do Brasil, Receita Federal, Comissão de No caso SwissLeaks, presentes os indícios de prática
Valores Mobiliários (CVM) e o Conselho de Atividades delituosa amplamente divulgada em meios de comunica-
Financeiras (Coaf), dispensando, obviamente, a reserva ção, o que não deixa de configurar instrumento legítimo de
de jurisdição para tanto, já que desnecessária autorização pressão pela transparência dos fatos que cercam o episódio,
judicial, sem prejuízo de imprescindível previsão legal para o interesse público, em sua vertente social ou econômica,
cada situação autorizadora de acesso e uso determinado caracteriza fundamento suficiente de amparo à quebra de
da base de dados sigilosa, que deve traduzir a necessidade sigilo bancário do conjunto de indivíduos que compõem a
e utilidade do respectivo conhecimento para apurar sus- documentação comentada. Ademais, como ensina o ditado
peita da prática de infração penal e extrapenal, bem como popular: quem não deve não teme!
administrar riscos que envolvem operações de créditos.
Foi exatamente com esse espírito que o Superior
O conceito extrapenal acima utilizado como funda- Tribunal de Justiça, analisando caso análogo (RMS 32.065/
mento paralelo da quebra do sigilo bancário contempla PR – Rel. Min. Campbell Marques), considerou legítima a
principalmente a hipótese de investigação de ilícitos graves investigação sobre informações constante de fundada de-
cometidos com violação à lei de improbidade administra- núncia anônima. Nada obstante vedado o anonimato pela
tiva (Lei nº 8.429/92) que, no mais das vezes, trata de dano Constituição brasileira, bem como eleito o sigilo bancário
ao patrimônio público com efeito multiplicador que chega à condição de direito individual de ordem constitucional,
a comprometer investimentos públicos e causar prejuízo suas medidas protetivas e de garantias individuais não
de ordem social, afora a questão moral e o efeito nocivo da guardam finalidade de acobertar provável ocorrência de
perda de credibilidade da Administração Pública. ilícito, o que se configura quando levantado obstáculo à ob-
tenção e consequente investigação de potencial veracidade
No âmbito da evolução da doutrina a respeito do tema, e verdade material dos dados sigilosos obtidos por notória
percebendo um sistema de equilíbrio que procura com- associação internacional de jornalismo investigativo.
patibilizar direitos individuais e bens coletivos, a teoria
externa (Aussentheorie) do autor alemão Friedrich Klein, (*) KLÉBIO CORDEIRO COELHO é procurador do
numa visão individualista do plano social, adota uma Banco Central em Recife, pós-graduado em Direito
visão de conceitos autônomos para direito individual e
respectiva restrição e explica a possibilidade de violação Administrativo e Constitucional pela UFPE.
baseada na transformação de suposto direito ilimitado em
direito limitado. Numa visão que enxerga o indivíduo como
parte da sociedade, o filósofo Robert Alexy entende que os
direitos individuais são concebidos não como posições
definitivas, mas como princípios que têm como condutores
de sua eventual violação o “... postulado da adequação dos
meios utilizados para a persecução do fim desejado. (...) e
o postulado da necessidade desse meio.”
O entendimento que reflete o indivíduo como parte
integrante da coletividade, detentor de direitos individuais
relacionados ao sigilo de dados, que não são absolutos, per-
mitindo extração da limitação e gradação da aplicação do
próprio conteúdo do direito declarado, caracteriza sistema
que favorece expedientes de investigação de episódio em que
paire suspeita e indícios de malversação do dinheiro público.
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