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aumentaria não só a base da CSLL, mas        maior peso da carga são os mais pobres, já                     A CARA
também do Imposto de Renda, que é            que a maioria dos impostos incide sobre o                      DA CRISE
compartilhado com estados e municí-          consumo final de bens e serviços.
pios”, sugere.                                                                           assunto é discutido em profundidade
                                                  Já Rubens Gandelman é totalmente       na reportagem da página 26.
     Cátia Uehara acha que o governo         contrário à MP: “O aumento de
deveria ter outro foco: “O país precisa de   impostos de qualquer natureza neste              O fato é que, de um jeito ou de outro,
uma reforma tributária sistêmica, e não      momento, seja na CSLL dos bancos,           a hegemonia do capital financeiro per-
apenas da elevação da carga sobre esse ou    seja na CPMF sobre o consumo, são           manece incólume. Toda a política eco-
aquele setor, sob pena de ocorrer o repasse  medidas desesperadas de apagar              nômica, aliás, continua sendo desenhada
para preços e taxas.” A seu ver, seria bem   incêndio.” A questão central, a seu         conforme os interesses dos bancos.
mais interessante que o ajuste fiscal em     ver, é a concentração bancária, que só
vigor pudesse resolver as distorções do      será resolvida se o Brasil incentivar
sistema tributário, onde quem arca com o     a criação de bancos cooperativos. O

“excesso” de moeda. Segundo o balanço de demonstrações              No entendimento de Fattorelli, a atuação do Banco
financeiras de 30 de junho, o BC já acumula mais de R$ 1,1     Central tem impedido que isso aconteça, pois garante
trilhão com esse tipo operação.                                aos bancos a generosa remuneração dos títulos da dívida
                                                               sem risco algum. A justificativa que tem sido dada para
     “Dá para imaginar o enorme ganho dos bancos com           essa atuação é o “combate à inflação”. Tal argumento não
tais operações, ainda mais devido ao fato de que os ju-        se aplica, na sua visão, pois o tipo de inflação que temos
ros dessas operações têm de ser pagos às instituições          no Brasil decorre do abusivo aumento do preço de tarifas
financeiras em moeda corrente.” O mais grave, para ela, é      de preços administrados (energia, telefonia, transporte,
que tais operações acabam gerando dívida pública, sem          combustível, etc.) e de alguns alimentos.
contrapartida alguma ao país.
                                                                    Como se vê, a relação entre juros e dívida pública é
     De acordo com Fattorelli, “essa política monetária        bastante complexa. Mesmo assim, o assunto tem sido
equivocada e onerosa tem outra consequência grave: in-         escamoteado das grandes discussões em torno da crise
fluencia o patamar de juros cobrados da sociedade pelas        econômica. Há, no entanto, tímidos sinais de que pode
instituições financeiras”. À medida que o Banco Central        haver uma mudança em certos segmentos. O jornal Folha
absorve todo o excesso de moeda que os bancos têm em           de S.Paulo, em duas ocasiões recentes, propôs a fixação
caixa, entregando-lhes, em troca, títulos da dívida interna    de um limite para o endividamento da União. A ideia, aliás,
que rendem os maiores juros do mundo, desestimula que          não é nova. Fattorelli lembra que a fixação de limite para
os bancos reduzam as taxas cobradas do mercado. Por            a dívida pública mobiliária federal está prevista na Lei
conta disso, acrescenta a auditora, os bancos não têm          de Responsabilidade Fiscal (conforme inciso II do art. 30
interesse em correr risco para emprestar ao mercado. Só        da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000). Tal
o fazem a taxas elevadíssimas, que atingem 400% ao ano.        limite, contudo, nunca chegou a ser regulamentado pelo
                                                               Congresso Nacional.
     O que ocorreria se esse montante de R$ 1,1 trilhão reti-
rado pelo BC estivesse no caixa dos bancos? Provavelmente           Falta, para usar o velho clichê, “vontade política”. Na
os bancos destinariam esses recursos para empréstimos,         ausência desta vontade, o governo segue enxugando gelo.
aumentando a oferta, o que provocaria uma forte queda          Vai cortar gastos da saúde, da educação, congelar o salário
nas taxas de juros. A competição entre os bancos seria mais    do servidor, aumentar impostos. Mas não terá coragem de
acirrada no sentido de oferecer taxas menores às pessoas       mexer uma vírgula na lucratividade do sistema financeiro.
e empresas, o que levaria a uma redução ainda maior nas
taxas cobradas pelo setor financeiro no Brasil.

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