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PERDAS E DANOS esse cenário. A agência de classificação impactos dramáticos que a PEC trará
de risco Fitch, por exemplo, projeta para a saúde pública. Em 2017, a previ-
Daqui pra frente, as despesas com saúde crescimento de 0,7% do PIB brasileiro são é que R$ 4 bilhões deixarão de ser
e educação deixarão de representar uma em 2017 e 2%, para 2018. Assim, com aplicados nessa área. Em 2018, serão
parcela fixa da receita da União. Em vez a recuperação da economia, ainda que R$ 8 bilhões a menos.
disso, estará garantida somente a corre- tímida, a Receita Corrente Líquida da
ção pela inflação, sem aumento real para União voltará a crescer. Nesse caso, os O mais impressionante é que a equi-
as duas áreas. O professor João Sicsú, do orçamentos da saúde e da educação serão pe econômica parece ignorar as proje-
Instituto de Economia da UFRJ, elaborou beneficiados, se for mantida a metodo- ções demográficas. Como o Brasil vai
a tabela ao lado, na qual se vê uma simu- logia em vigor que prevê o crescimento dobrar sua população idosa em 20 anos,
lação do que teria ocorrido nos últimos das despesas com base na elevação da de acordo com as previsões do IBGE, um
dez anos com a saúde e a educação se já receita. Com a aprovação da PEC 241, aumento real do valor destinado para a
estivesse em vigor a PEC 241. contudo, a realidade é outra no que diz saúde será imperativo. Esse aumento não
respeito à saúde e à educação públicas. virá por conta da PEC 241, que congela os
Se a PEC 241 já estivesse em vigor, o gastos, tendo como base o ano 2016.
orçamento da saúde, em 2015, teria sido O prejuízo para as universidades fe-
R$ 65,2 bilhões, o que representaria uma derais e os institutos de ensino tecnoló- “O problema não para por aí”, avalia o
perda de R$ 36,9 bilhões. Na educação, gico, por exemplo, será significativo, por professor Fábio Pereira dos Santos, doutor
o orçamento ficaria em R$ 31,5 bilhões, se tratar de dois setores que vinham re- em Administração Pública e Governo na
uma perda de R$ 72,3 bilhões! cebendo atenção especial até a chegada FGV/SP. Além do aumento da população
de Joaquim Levy na Fazenda. O estrago, idosa, haverá crescimento de mais de 9%
O governo pode contra-argumentar porém, vai muito além do ensino supe- da população em geral até o período final
que a tabela acima se refere ao passado. O rior público. Segundo os reitores das de vigência da PEC. Congelar os gastos,
ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, universidades federais que participaram nesse cenário, representa produzir uma
tem dito que o limite para o crescimento da última reunião do Conselho Pleno, queda do valor per capita aplicado em
das despesas preserva os investimentos que representa os dirigentes do setor, saúde até 2037. “Isso vai na contramão
em educação e saúde. Ele afirma, até, que realizada em julho, as metas previstas no da experiência de praticamente todos os
essas despesas poderão ser reajustadas Plano Nacional de Educação não serão países, que mostra aumento do gasto em
acima da inflação. Será? alcançadas caso a PEC 241 seja aprovada. saúde como percentual do PIB, seja esse
gasto público ou privado.”
No ano passado, por exemplo, os O rombo na saúde também será gi-
gastos federais em educação supera- gantesco, revertendo conquistas recen- A consequência inevitável dessa me-
ram em 28% o mínimo obrigatório tes que demandaram muita luta. Afinal, dida, acrescenta Santos, será a deteriora-
pela Constituição, equivalente a 18% desde os anos 1990, vem se tentando ção dos serviços oferecidos, a sobrecarga
da receita dos impostos. Mesmo que o garantir uma base financeira para o SUS. de estados e municípios e restrições cada
governo resolva aumentar as despesas Em tese, a aprovação da CPMF em 1996 vez maiores ao acesso universal à saúde,
sociais acima da inflação, fica evidente teve esse objetivo, mas, por se tratar de assegurado pela Constituição Federal.
que a nova regra não tem condição de uma contribuição vinculada ao SUS,
fazer frente à metodologia atual baseada o governo Fernando Henrique acabou SAÍDAS PARA A CRISE
no crescimento da receita. utilizando o tributo para outros fins. Foi
somente com a Emenda Constitucional Diante desses números, uma pergunta
O único cenário em que a lógica de 29/2002 que se estabeleceu a obrigato- se impõe: o teto para gastos é inevitável?
Meirelles faria sentido é o que supõe a riedade de aplicação de valores mínimos Afinal, o governo alega que o Estado não
manutenção do quadro macroeconômico em cada um dos entes federados (União, tem caixa, por conta de uma grave crise
atual, no qual o PIB continua despencan- estados e municípios). Em 2016, para fiscal. Se isso for verdade, a PEC 241 é a
do, a arrecadação também, mas a inflação que se tenha uma ideia, a União tem a única solução possível?
persiste sua trajetória acima da meta. O obrigação de investir 13,2% da receita
teto inflacionário para 2016, fixado pelo corrente líquida em saúde. Os especialistas se dividem.
BC, é de 6,5%, mas as previsões indicam Segundo José Márcio Camargo, pro-
uma inflação de 7,2%. A tabela na página 8 mostra os fessor de Economia da PUC-Rio e sócio
da consultoria Opus, o grande méri-
Nem mesmo os analistas de merca- to da PEC é propor uma discussão de
do mais conservadores trabalham com
SETEMBRO 2016 7