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econômica essencialmente hostil ao        variam a todo momento, que garanta              “O governo quer fazer
desenvolvimento”, afirma o econo-         a expectativa. “A própria variação das         omelete sem quebrar os
mista Paulo Nogueira Batista Júnior,      projeções é um sinal da insustentável         ovos ao tentar garantir a
professor da Fundação Getúlio Vargas      certeza do crescimento”, diz João           estabilidade externa e realizar
de São Paulo. “O governo Lula nada        Sabóia. “A meta de 3,5% também               o que a sociedade espera: o
fez até agora para alterar esse quadro.   não chega a ser nenhum espetáculo.”
Pior: aprofundou o compromisso com                                                             crescimento.”
o modelo herdado de seu antecessor.”      O “MILAGRE”
                                          BRASILEIRO                                        JORGE SAAVEDRA DURÃO
    Os que enxergam a sociedade à         Comparada às duas últimas décadas                   Diretor-geral da Abong
frente da economia não poupam ma-         perdidas, até que é. Mas se espelhada
nifestações de frustração. “O governo     com o que aconteceu no País entre a         extremos”, afirma Jorge Durão.
quer fazer omelete sem quebrar os         2ª Guerra Mundial e 1980, não passa-
ovos ao tentar garantir a estabilidade    ria de um desempenho mediano. Da            O CUSTO DO
externa e realizar o que a sociedade      década de 50 ao fim do regime militar,      ENDIVIDAMENTO
espera: o crescimento”, endossa Jorge     a economia brasileira exibia dinamismo
Eduardo Saavedra Durão, diretor-          de país emergente de primeira classe.           Preso a uma dívida interna e exter-
-geral da Associação Brasileira das       O Produto Interno Bruto (PIB) crescia       na que só de juros consumiu no ano
Organizações Não-Governamentais           em média 7% ao ano.                         passado 9,5% do PIB, o equivalente a
(Abong). “O primeiro ano de governo                                                   R$ 145 bilhões, o governo Lula se en-
Lula foi tucano. O presidente talvez          Não era milagre. Custou o preço da      contra numa encruzilhada. Se pudesse
não tivesse alternativa na condução       concentração de renda, do descontrole       pagar apenas a metade do que hoje
da política econômica, mas daqui          das contas públicas, do desequilíbrio       desembolsa, restariam 4% do PIB para
para frente dificilmente vai conseguir    das contas externas e da inflação anual     investimentos. Por baixo, R$ 70 bilhões.
continuar reproduzindo o que fez          de três dígitos. Deu no que deu. Quase      É mais de 11 vezes o que será econo-
Fernando Henrique Cardoso sem re-         meia dúzia de planos, que ora alimen-       mizado com o corte de R$ 6 bilhões do
ações”, avalia o historiador José Murilo  tavam a bolha de crescimento às custas      Orçamento de 2004. Para quem gosta
de Carvalho.                              de uma hiperinflação, ora represavam a      de números: quase seis vezes mais do
                                          inflação às custas da estagnação.           que os R$ 11,7 bilhões previstos para
    O governo tem procurado manter                                                    investimentos este ano, puxados pelos
as esperanças. “Não há nenhuma hi-            O modelo econômico lançado no           R$ 2 bilhões reservados à nova política
pótese de a economia brasileira não       governo Collor e mantido por Fernando       industrial, R$ 1,6 bilhão para o crédito
crescer este ano. Possivelmente não       Henrique Cardoso encarregou-se de
crescerá o tanto que gostaríamos que      travar de vez o desenvolvimento. “Os
crescesse, mas vai crescer de forma       economistas e financistas do Ministério
sustentável”, afirmou Lula, depois da     da Fazenda e do Banco Central podem
divulgação da última projeção do Ins-     ter as suas diferenças táticas ou de
tituto de Pesquisa Econômica Aplica-      ênfase, mas estão unidos no essencial:
da (Ipea), que reduziu de 3,6%, em        a convicção de que o que vinha sendo
dezembro, para 3,4% a estimativa de       feito estava fundamentalmente corre-
crescimento econômico em 2004.            to”, diz Paulo Nogueira Batista Júnior, da
Não há nada, além das manifestações       FGV. “Nada mudou. O endividamento
presidenciais e das projeções que         e a vulnerabilidade externos continuam

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